Muitos são os marcos legais que regem a atuação do NArTE, desde a Constituição Federal de 1988, até os diversos Planos que foram criados neste nosso curto processo democrático, como o Plano de Convivência Familiar e Comunitário e o Plano de Combate à Violência Sexual, para citar dois exemplos. Apesar disto, é inquestionável que em nossa atuação cotidiana o Estatuto da Criança e do Adolescente e o Estatuto da Juventude são a base sobre a qual construímos nossa incidência e atividades no CCBJ. Isso ocorre devido ao fato do nosso público majoritário está resguardado sob este aparato legal, mas também por haver nestes documentos uma série de princípios que ecoam e harmonizam perfeitamente com os objetivos que listamos.
Redução de danos foi termo cunhado por profissionais de saúde a partir de uma nova metodologia de trabalho com pessoas que faziam uso abusivo de substâncias químicas. Estes profissionais sugeriam que no lugar da abstinência, deveríamos pensar em outros modos de lidar com o “vício”, analisando a “droga” em seu significado social mais amplo e relacionado com a realidade na qual aquele usuário estava inserido. Assim, buscando evitar a marginalização deste indivíduo, a Redução de Danos se caracteriza por ser uma metodologia que respeita o universo do educando e busca gerar processos permeados por uma criticidade, onde este indivíduo se reconheça como um sujeito de direitos e encontre a melhor forma de lidar em sociedade. Assim, na atuação do NArTE, a Redução de Danos se torna alicerce imprescindível, não apenas com relação ao uso abusivo de drogas, mas também sobre uma série de condições sociais que precisam ser analisadas em conjunto com o educando em busca de um processo que potencialize os Direitos Humanos.
Este conceito demarca uma ação pedagógica ativa. É necessário entender que, dentro de um conceito histórico de vulnerabilidade, é comum que o educando (bem como um usuário do CCBJ) não se perceba como um indivíduo sujeito de direitos, mas sim à margem da cidadania. Colocar a Busca Ativa como um elemento fundante da ação do NArTE indica que as educadoras deverão promover atividades que busquem a aproximação com esse público para a construção de vínculos, “para atingir esse objetivo utiliza-se jogos, revistas ou livros, técnicas de troca de olhares, falas espaçadas e etc” (LIRA, 2003);
Acreditamos em elementos fundamentais erguidos por Paulo Freire como fatores indispensáveis para qualquer processo pedagógico. Dentre muitos destes conceitos é importante destacar três: a impossibilidade de uma educação que não seja precedida por uma construção de vínculos; a necessidade de todo processo entre educador e educando ousar a horizontalidade; a o respeito irrestrito que as educadoras devem possuir pela história e subjetividade de cada um dos educandos. Estes três fatores, encontrados fartamente nos livros “Pedagogia da Autonomia” (1996) e “Educação como prática de liberdade” (1967), dentre outros, nos impele a utilizar metodologias pedagógicas que possibilitem, utilizando conceitos criado por Pereira (2002) em sua análise sobre o Projeto Axé: a “paquera pedagógica” – fase na qual ocorre a observação do território e dos elementos que permeiam a vida do educando; o “namoro pedagógico” – etapa onde o vínculo é construído, quando já há confiança e o diálogo permite ao educador construir análises com o educando; o “aconchego pedagógico” – quando educador e educando elaboram novos projetos de vida, para a construção de um cidadão crítico;
O CCBJ se encontra em um território que foi historicamente negligenciado pelo poder público, o que acarretou em uma série de demandas que fez com que a região fosse sempre pautada nos jornais policialescos como um “espaço de violência”, soma-se a isto diversos conflitos que ocorrem e insuflam os dados sobre violação de direitos no GBJ. Diante disto, Cultura de Paz torna-se um conceito urgente: “de acordo com a UNESCO, a cultura de Paz ‘está intrinsecamente relacionada à prevenção e à resolução não-violenta de conflitos’ e fundamenta-se nos princípios de tolerância, solidariedade, respeito à vida, aos direitos individuais e ao pluralismo”. Sendo assim, tratamos Cultura de Paz como instrumento ativo para a geração de um outro modo de vida, longe de tomar o conceito como uma “passividade mórbida”, ele se torna no CCBJ fundamento da ação.
É notório que a Carta Universal dos Direitos Humanos é uma das bases fundamentais de toda a ação promovida pelo NArTE. Seus critérios com relação à liberdade e promoção de justiça para todas as pessoas regem a concepção de cada uma das atividades que vão ser listadas, no entanto, mais que isso, é urgente os recortes de raça, classe, gênero e orientação sexual que fazemos a partir deste documento. Quer dizer, para um Centro Cultural de base comunitária estas pautas identitárias se tornam ainda mais urgentes, frente, por exemplo, ao extermínio da juventude negra e ao feminicídio. Assim, quando tratamos de Direitos Humanos a partir da arte-educação, focamos a todo o momento nestas relações de poder a fim de implodi-las.
Como um equipamento da Secretaria de Cultura, o NArTE pauta sua ação fundamentalmente sobre o alicerce da arte educação como um instrumento-meio, quer dizer: o processo sócio-pedagógico se dá mediado pela linguagem artística, que se torna, portanto, mecanismo fortalecedor da construção de vínculo pedagógico. Esta perspectiva fundamenta-se fortemente sobre a compreensão de MAE (1998, pg. 16) quando ela indica a arte como retina pela qual “temos a representação simbólica dos traços espirituais, materiais, intelectuais e emocionais que caracterizam a sociedade ou o grupo social, seu modo de vida, seu sistema de valores, suas tradições e crenças. A arte, como uma linguagem presentacional dos sentidos, transmite significados que não podem ser transmitidos através de nenhum outro tipo de linguagem”, assim, é por meio da arte que identificamos os diversos elementos sociais nos quais o CCBJ e seus usuários estão inserido, mas não obstante, é também com a arte educação que nos mobilizamos para uma nova perspectiva e análise sobre esse cenário, buscando perceber o ser humano em “sua plenitude. [e] para isso, é necessário virar o mundo de cabeça para baixo. Inverter a proposição de que ser é ter. Buscar o lúdico no coditiano. Olhar o mundo com espanto” (FONTENELES; BARON; FARIA; GARCIA, pg. 23), ou seja, nos utilizamos da arte-educação não apenas como linguagem para olhar o mundo, mas também como perspectiva de ação e reencatamento do mundo.